quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

 



         Revisão Ortográfica

    Prof. Jorge Henrique Vieira


Como escritor cordelista

Eu fui convidado um dia

Para ouvir uma palestra

Numa certa academia.

Era um doutor bacharel

Falando sobre o cordel,

Um tipo de poesia


Há anos classificada

Como sendo inferior,

Chamada de popular,

Porque dela o escritor

Não tem grau de formação,

Não usa um anel na mão,

Nem tem títulos de doutor.


O preletor da palestra,

Um defensor do cordel,

Pesquisador renomado,

No assunto é bacharel,

Igualando a poesia

Com as da academia,

Houve ali um escarcéu.

 

            02

Pois um poeta acadêmico

Achando ter mais saber

Que poetas cordelistas

E querendo aparecer

Falou: - Está endoidando

Por estar nos comparando

Com gente sem saber ler.

Eu, estando ali presente,

Achei uma aberração,

Disse: - Moço, me desculpe

Por entrar nesta questão.

O senhor está errado,

Eu posso não ser formado,

Mas analfabeto não.

Você se acha importante,

Mas lhe falta a humildade

Para dar valor o outro,

Mesmo na simplicidade.

Um poeta popular

Não usa esse linguajar

Da alta sociedade,

Mas respeita o semelhante

E dá valor ao alheio.

E onde não foi chamado

Não vai se meter no meio

Como você fez agora.

O palestrante de fora

Dar esta palestra veio.

            03

Irritado perguntou-me:

- Quem és, eu quero saber?

- Sou o que você não é

E nunca virá a ser:

Um poeta cordelista.

Esse dom não se conquista,

Já vem conosco ao nascer.

A poesia em cordel

Agrada a grego e troiano,

É igual a qualquer outra,

Não fica em segundo plano

E o poeta popular

É lido em qualquer lugar

Sem ser shakespeariano.

Ariano Suassuna,

Uma pessoa importante,

Usou livros de cordel

Numa peça hilariante,

O Auto da Compadecida,

Tornou-se mais conhecida,

Não ficou só na estante.

Por isso, caro poeta,

Não queira se enaltecer,

Que até num analfabeto

Temos o que aprender.

Tem coisas que ele faz

Que você não é capaz

De lhe imitar ou fazer.

            04

Carlos Drummond de Andrade,

Este poeta bacana,

Ele escreveu um cordel

(Estória de João-Joana)

E já virou musical.

Eu achei muito legal

Onde a humildade emana.

Ser poeta evoluído

É ter consideração

Pelo trabalho do outro,

Trata-lo como um irmão,

Não querer diminuir.

Se queres evoluir,

Tenhas mais educação.

Ele olhou para mim

Com uma cara de espanto

Como se dissesse “onde

Foi que ele aprendeu tanto?”,

Mas falou com ironia: -

Ser membro de academia

Não tens condições, garanto.

Os anéis de formaturas

Mostram que somos doutores

E todos Ph.D.

Alguns em vários setores.

O poeta de cordel

Nenhum possui um anel

Para mostrar seus valores.

            05

O valor de um ser humano,

Lhe digo neste momento,

Não se encontra num anel,

Mas no seu comportamento.

Em você está faltando,

Que está se comportando

Quase igual a um jumento.

Escritor que não respeita

O poeta de cordel

Devia se envergonhar

De usar no dedo um anel,

Pois não respeita a cultura

Na sua forma mais pura,

Vinda de um tabaréu.

Já que se achas doutor,

Queira dar-me uma lição,

Me pergunte o que quiseres

Com a sua formação.

Garanto que não me ofendo.

Se não souber, eu aprendo

E lhe terei gratidão.

Na hora ele respondeu:

- Agora eu vou lhe provar

Que o seu estudo é pouco

Para estar neste lugar.

Se não souber as respostas,

Por favor me dê as costas

E pode se retirar.

            06

Quem inventou luz elétrica?

Me responda essa primeiro.

O inventor Thomas Edson.

Também foi um brasileiro

Que com a sua invenção

Nos livrou da melação

Que fazia o candeeiro.

E quem inventou o rádio?

Que faz a voz viajar?

Foi o Roberto Landell,

Que pôde a voz transportar

E com sonorização

Minha voz na amplidão

Vai até outro lugar.

Me diga quem inventou

Também radiografia?

Que vê o corpo por dentro,

Coisa que ninguém não via.

Foi Manoel de Abreu,

Doença não se escondeu

Mais depois daquele dia.

Quem inventou o retrato?

Que mostra as feições da gente?

Antoine Hércules Florence,

Homem muito inteligente

E num retrato falado

Um bandido é encontrado

E preso rapidamente.

            07

E o soro antiofídico?

Pro veneno da serpente?

O grande Vital Brasil,

Cientista competente,

Que com a sua invenção

Já salvou nesta nação,

Com certeza, muita gente.

Quem inventou telefone?

Lhe digo de bom agrado

Primeiro Antônio Meucci,

Mas depois foi ampliado

Por Alexandre Graham Bell.

No Brasil, a Anatel

É quem tem gerenciado.

Quem inventou geladeira?

Uma mulher, não a minha

Foi a Florence Porpart,

Que sabedoria tinha.

Que ela bendita seja!

Graças a ela, a cerveja

Eu tomo bem geladinha.

Na hora ali todos riram

Com esta colocação.

O acadêmico orgulhoso

Viu que perdeu na questão.

Quem estava no local,

Mesmo achando bom ou mal,

Aprendeu uma lição.

            08

Eu não quis neste cordel

Ofender quem quer que seja,

Mas exijo mais respeito

Com a classe sertaneja

Nordestina tão sofrida

Entre as labutas da vida

O que é bom sempre almeja.

Sou filho de um matuto

Que nunca aprendeu a ler,

Fez questão que eu estudasse,

Morreu feliz por saber

Que poeta eu me tornei

E hoje tudo que eu sei

Tenho que lhe agradecer.

Meu pai, meu muito obrigado

Por sua simplicidade.

Não eras rico em dinheiro,

Mas rico de humildade

E de ti cada lição

Gravei no meu coração

E levo pra eternidade.

Leitores eu relatei

Aquela cena passada,

Lição que neste cordel

Vai ficar bem registrada

E o acadêmico teve

Sua soberba quebrada

Nossa Senhora da Glória – 23/12/2021

Nenhum comentário: